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quarta-feira, agosto 17, 2016

Vontade de poesia


A poesia me lava a alma
Não como quem lê um poema
Na poltrona da biblioteca
Mas como quem esfrega o cloro
No limo do azulejo
Esfrega os sentires
Com preguiça e coragem
De quem apenas sabe
Que é preciso fazer

A poesia me nutre
Não como quem declama arrogante
Em palanque de ego
Mas como quem corta devagar o alimento
Refoga, mexe a panela e vigia o fogo
Até saber o ponto
Que às vezes passa ou nunca chega
Que também não tem medida exata
Mas que existe o gosto
De ver pronto e cheio o prato

A poesia me alimenta
Não como quem compra livros
Mas como quem prova devagar a comida
E mesmo assim queima a boca
Porque tem apetite de quem sabe
Que desconhece a fome
Como quem enche o prato
Das variedades da vida
E vai provando as diferentes partes
Como quem come escondido
Ou engole a seco
quando precisa lembrar
que esquece que há muitos pratos
e muitas fomes pra saciar ao redor

A poesia me sacia
Não como quem suspira
e faz pausa dramática
Ao final da frase
Mas como quem desmancha o corpo
na troca do toque
e ainda assim continua
até a exaustão

A poesia me acompanha
Como quem marca na pele
a lembrança
De que sentir fere e cansa
Feito rima desgastada
Mas que dela que ficam
as belezas desenhadas