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segunda-feira, novembro 21, 2005

Direto do caderno de sorvete - o grande

Eu queria mesmo é saber como foi que tudo começou. Mas o que é tudo? Sem filosofias chavões, lembra? Quando é que foi exatamente que eu me transformei nisso? Ora, se houvesse ponto exato para se tornar qualquer coisa... Eu posso. Entornar minha alma no abismo de uma madrugada até formar uma poça de sangue. Eu poço. O fato, certo ou não, é que acabei ficando assim: desse jeito. Acabei me tornando irremediavelmente e imperdoavelmente eu mesma. Sem saber não fazer uma coisa que quero fazer. Seguindo isso que chamam de impulso ou quem sabe desejo. Inconsequente.

"Uma vez, descobri que a vida é desesperada. Mas vale a pena?" Eu sinceramente não sei. Eu nunca sei. As coisas vão tomando outros rumos, existem ainda mais estradas por aí. E estragos. E estranhos. Como foi surgir essa tal intimidade? Parecem vidas diferentes... Eles também me fizeram. Tem tanta coisa fazendo-me por todos os lados, o tempo todo, e fica impossível determinar com exatidão quem eu sou. Coerção. "Por ser exato..." Eu teria de parar de viver um instante para isso. Morrer? E parece que tudo que eu sou só existe em função de saber quem eu sou - é inútil. e dá-lhe mais filosofia chavão.

É isso aí. Simplesmente sempre diferente dos planos de tantos e tantos anos. De que é feito o pensamento? Sou eu mais uma vez, mais uma noite, sentada sozinha no sofá da sala. Caderno e caneta em mãos. Hoje o som desligado. Sem influências externas. Eu devo ter tido um ponto de partida. Algo como uma molécula dizendo sim à outra. Algo como uma cabeça se apoiando disfarçada na outra. Algo como um telefonema em dia de chuva. - Há histórias com dois começos - Algo como uma conversa determinada, meio por acaso num dia qualquer, buscando um lugar comum. "Vamos fazer um filme?" Eu podia contar a famosa história do elevador - que eu realmente adoro contar - mas assim o início não seria propriamente meu. Coisa de terapeuta tentar buscar tanta origem para as coisas. São só fatos. Quem pediu que explique, porra?

Eu vi um casal trepando na rua de madrugada. Fiquei curiosa pra saber quanto ela cobrava. Acabei não indo ao show. Uma espécie de punição para os meus atos imperdoáveis. Droga. Que merda. Por que a mulher sempre acha que vai salvar o homem? Qual a razão de querermos ser sempre os mais importantes na vida de todo mundo? Não nos chega a nossa? Não. Nunca chega. A alma nunca cabe num corpo só. Puta carência afetiva. O útero é um lugar para onde certamente eu não quero voltar. Também não quero ir pro céu. Mesmo se quisesse, acho que não me deixariam mais. A caligrafia vai ficando assim torta. Queria um dia escrever na velocidade dos meus pensamentos sem ter que pensar mais devagar para isso.

Eita, era pra contar uma história. Os dedos balançando na frente da boca. Não deu para ouvir. É um saco isso de ter que continuar vivendo apesar de. Vontade louca de sumir no mundo, sumir do mapa. Jogar tudo para trás - e não para o alto. De viver a vida como a música do último dia. Mandar o mundo se foder. Ir para um lugar bem longe. Comer todo o chocolate que eu conseguisse.

E se tudo tivesse sido diferente...? Não sei se a vida teria tanta graça se eu naõ fosse uma farsa. Se eu morresse amanhã eu queria... Ah, deixa pra lá os meus quereres. Que merda também isso de a gente não poder mergulhar de cabeça em tudo o que quer. "E se eu fosse o primeiro a voltar pra mudar o que eu fiz? Quem, então, agora eu seria?" Podia ter sido diferente... E nós nunca vamos saber. Não adianta que hoje eu não vou conseguir fugir desses clichês pseudo-filosóficos. Logo que queria tanto fugir de tudo. Eu quero também um dia casar e ter filhos. Afinal, não sou de ferro. Mas acho que se for para engravidar tem que ser uma trepada muito boa pra compensar o parto. Sei lá, também. Não quero nada. O que sei é que a gente muda, vai mudando de sonhos e chega uma hora em que nem percebe, nem lembra. Tenho talento pra ficar calma em horas difíceis, desencanar. Talvez uma predisposição a esperar tudo da vida. Tá dando raiva isso de ver as coisas caindo na rotina e não poder fazer nada. Eu posso. De novo? Pode esperar que da próxima vez vai ser tudo diferente. Eu tô falando pra quem? Isso não vai pra gaveta. Nasci mesmo na contramão. Hoje era eu que queria ser dobrada e guardada na gaveta pra alguém encontrar depois. Amor tem muitos jeitos. Você é pequena ainda pra entender, Eliza. Achei o começo. Foi assim: " - Fizeram-te."

Um comentário:

  1. Eu me pergunto quando vai passar essa mini-obssessão astrológica, mas mesmo assim vou dizendo - geminiano isso.
    Volta e meia eu me acho pensando em ser de gêmeos. Em seres de gêmeos. Difícil ('mas o que não é!'), difícil.
    "Você é pequena ainda pra entender, Eliza."
    Acho que você é muito pequena e tem tanta muita coisa pesando sobre você. Você, que é magrinha e pré-disposta a esperar tudo da vida. Às vezes penso que você é forte, mas temo pelo peso que há.

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