Ao som de Sentidos (Zélia Duncan).
Paralelas que cruzam portais. Alguma preservação que pode
ser censura. A sinceridade que nunca é desmedida, muito pelo contrário. Os
turnos trocam. Os porteiros pensam sabe-deus-o-quê e eu vou levando os dias sem
parar para poetizar. Não, não é que seja a tal poesia. Tem hora que não é dela mesmo
que se carece. É algum tipo de balanço que é necessário às vezes, mas se permitem a repetitividade, ainda prefiro escolher o balanço de parquinho
com seu ir e vir ambíguo em alta velocidade no meio da chuva.
Mas tem que contabilizar para seguir em frente. Transformar
em palavras, dar significado, compreensão. Ajeitar para cada coisa seu
lugarzinho devido na estante: o de lembranças-bibelôs sonhando com bonecos de
gesso que conheçam o kama sutra.
Meço com fitas coloridas de senhor do Bonfim os cílios que
se abrem em olhos tão famintos cuja lembrança desperta pensamentos vestidos
sempre em vermelho sangue.
Contabilizo com tecidos de cortina a quantidade de pontos
que pode ter um sorvete de flocos, embora tema o conforto das conchas mesmo distantes
do barulho do mar.
Ensaio vinganças, ativismos, copio cenas de filmes que
ninguém nunca viu.
Defino minha vida pelo sexo. Sexo que eu estudo. Sexo que eu
desencavo nas pessoas cujas vidas já não me pertencem e eu bem sei que nunca
pertenceram.
Conto meus dias pelas trepadas e ouso dizer estou na idade. Abro
meus olhos pro mundo e encontro vez ou outra meu reflexo em outros pares
diversos. Olhos que instigam. Olhos que investigam o prazer a fundo. Corpos não
são mesmo vídeo games, afinal. Trepo para transformar em conto. Só sexo é
escrita? Amor nunca? Paixão às vezes. Palavras encardidas e bobas, além de
temporariamente fora do vocabulário. Fujo de qualquer coisa que me queira perto
demais. Quero qualquer coisa que me queria longe. Procuro farpas, invento
desculpas, provoco uma briga e digo que não estou.
Estou no reflexo dos seus olhos e nos meus que embaçam e
fecham para sentir melhor as especificidades de cada pessoa. É muito mais que o
cheiro da curva-do-pescoço com o ombro. A textura da pele nunca é igual, assim
como o cheiro do sexo, o ritmo da língua.
A vulgaridade de sempre me cerca. Contudo, agora, creio-me
com poros mais atentos ao que a experiência reserva. Percorro seus meandros, me
deixo levar. Mais ainda exibo na janela os dentes e rosno para quem ousar passar
da página quinze.
Foi o melhor do dia. E li um bocado hoje.
ResponderExcluirAtenciosamente,
Um beijo