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sábado, maio 15, 2010

Alguns luares depois


Passaram- se alguns luares... vários deles. Alguns a gente viu do alto da roda, mente torpe, coração comprimido para não bater rápido demais, a hora correndo atrás. Lá de cima a nuvem pesada parece maior, negra, intransponível, quase sólida, prometendo um temporal que vai levar tudo. Sem falar dos raios e trovões. Eles turbam o céu anunciando uma chuva que dá medo. A gente se espreme no banco gelado, encolhe os pés, aperta os dedos contra o chinelo velho e segura firme no ferro frio e morto. Preciso de um calçaco!

Morto. Parece tudo morto. Como se o dia já nascesse morto lá em cima. A gente faz tudo sem fazer nada. A cabeça dói, os olhos secos doem, o sono interrompido dói. Não é tempo de muitos sorrisos. O céu "abril-se" fechando o mês e levando alguém querido com ele. Como ele atravessou aquela nuvem tão espessa e fria? Ah... ele devia saber das Ítacas, devia estar tranquilo também sabendo que lá, depois do arco-íris invisível metastaseado por aquele cinza da nuvem deve estar um céu bem azul.

Os sustos foram grandes. Sabe quando o banco balança e parece que a gente vai despencar lá embaixo? Não sabe? Claro. Você nunca foi a um parque de diversões. Você devia ir, vai acabar descobrindo que mesmo quando o aparelho está chato e as pessoas fazendo cara de assustadas, ou de medo, a tortura acaba. O moço sempre vira a manivela e bah! Acaba tudo.

A gente não caiu, nem vai cair. Os sustos foram apenas pedagógicos. A roda parece parada enquanto a morte ronda, mas a gente muda o final do filme. A gente até esqueceu um pouco o que ficou logo atrás dos ombros. Aqueles sorrisos, a-que-les sor-ri-sos! Lembra? Silenciosos comovem, barulhentos fazem a barriga doer e bagunçam os lençois. Bagunça boa... lembra tempo.

É, daqui de cima, pensando bem, não dá para ver direito. As pessos sumiram e só se vê o que é concreto, os borrões do asfalto, as luzes do carro passando rádido. Dentro deles imagino pessoas falando ou pensando freneticamente em tudo o que têm para fazer até virar o mês. Mesmo quando a gente se esforça, se concentrando em abrir bem os olhos não dá pra ver. Não dá pra achar nada que valha a pena contar, descrever animadamente, esculpindo a imagem à palavras, expulsando o mau humor com uma divertida história. Não, não vale a pena insitir naquele tumulto... não se salva nada. Só fica essa angustia... no fundo é bom, não falo da roda, falo da angustia. Alguém me dizia: não deixa água parada aqui dentro. Tão poucopra quem queria dizer coisas grandes, meio patético até, mas bem verdadeiro.

Sobra dentro, a gente começa a se questionar sobre coisas tão banais... Às vezes essa brincadeira de passar o tempo procurando o que fazer, o que escrever, acaba desencadeando uma mania de achar problema onde não tem. Já dizia a mamãe. É... o tédio e a impaciência. A gente não percebe, mas isso vai se enraizando tanto na rotina que depois é pior que erva-daninha pra matar. Xô pra lá! Entra no mar porque a coisa tá feia. Toma um banho de sal grosso, bate na madeira.

Faz uma respiração bem funda, tenta ultrapassar os limites da epiderme da alma, superfície calma? Esqueço sempre as letras...

Enfim, voltam os luares na história. Passaram-se vários, 10, 11... 12! A roda deve ter dado algumas voltas, a gente é que se perdendo em absurdos, não conseguiu anotar nada para contar nas horas de trânsito lento. Eu nem levei caderno... mas você pode sempre escrever em mim. "Me continua..."

Mas tiveram coisas bonitas no caminho, né? Conseguimos quase decorar as faixas de um ou dois shows inteiros. Acabou a pilha, mas hoje tem mais. Carne e osso, à cores e ao vivo. Chega desse papo de morte. Hoje tem 'mais do mesmo', que sendo da gente, não é monótono, é doce. É quase sempre doce. (Preciso encontrar um jeito de riscar o quase). É nosso e transforma a gente em luar.

"Coisas que eu sei - pensou - se eu for eu vou assim não vou trocar de roupa".

Eu vou, mas eu volto. E chego já.

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